ARTE
E ESTÉTICA: A AISTHÉSIS DO BELO EM
KANT
JOÃO BÔSCO ALMEIDA CRUZ [1]
RESUMO
O que nos move nesse artigo é o desejo de saber ou de procurar entender o
que é belo sobretudo, diante da subjetividade. Porém, diante da existência do juízo
estético, colocam-se ainda os problemas de estabelecer o que seja propriamente
o belo que nele se manifesta e
o de remontar ao fundamento que o torna possível.
PALAVRAS-CHAVE:
Belo, beleza, Kant,
contemplação, estética, arte, o belo em Kant, sensação, percepção, sentidos
ABSTRACT
What moves us in that article is the desire to know
or try to understand what is beautiful in front of subjectivity. However, given
the reality of aesthetic judgment, put the problems of establishing what
exactly is the beautiful that it manifests itself and to rebuild the foundation
that makes it possible.
KEI WORD:
Beautiful,
beauty, Kant, contemplation, aesthetics, art, beautiful in Kant, sensation,
perception, senses
INTRODUÇÃO
É necessário antes de
tudo clarificar o conceito, a idéia do que seja estética. A palavra é de origem
grega αισθητική ou aisthésis que significa “faculdade de
sentir”, “compreensão pelos sentidos”, “percepção totalizante”, “sensação”,
é um ramo da filosofia
que tem por objeto o estudo da natureza do belo e dos
fundamentos da arte.
A estética também estuda o julgamento e a percepção do que é considerado belo,
a produção das emoções pelos fenômenos estéticos, bem como as diferentes formas
de arte e da técnica
artística; ainda a idéia de obra de arte e de criação; a relação entre matérias
e formas nas artes. Por outro lado, a estética também pode ocupar-se do sublime, ou da privação da beleza, ou seja, o
que pode ser considerado feio, ou até mesmo ridículo.
Embora a arte faça parte do mundo humano desde a pré-história
e tenha ocupado lugar de grande importância em todas as civilizações,o termo
estética só foi utilizado em 1750 pelo filosofo alemão Alexander Baumgarten,
conceituando como teoria do belo e de suas manifestações através da arte. De
modo geral a estética atribui-se especificamente a tudo o que pode ser
percebido como agradável e belo pelos sentidos. Desta forma, como o estudo e
teoria do belo e de suas manifestações, a estética constitui um campo de
investigação filosófica que pretende alcançar um tipo específico de
conhecimento: aquele que se refere ao que é captado pelos sentidos. E como
veremos no desenvolver do texto, ele vai se constituir quase que um contraposto
ao conhecimento lógico-matemático.
1. A dialética do juízo de gosto
Diante de
um questionamento: O que é o belo? O ser humano pode fazer diferentes juízos.
(Juízo de fato, de valor, juízo moral e juízo estético). Ao dizer o que são as
coisas atribui-se juízo de fato, dizemos o que são as coisas; mediante o juízo de
valor, julgamos se determinada coisa é boa, ruim, agradável, bonita, feia
etc... O juízo de valor dividi-se em juízo moral e o juízo estético.
Os juízos
estéticos são evidentes estabelecidos por si só. Contudo, diante da existência
do juízo estético, estabelecem-se dois problemas: primeiro o de determinar o
que seja propriamente o belo que nele se manifesta; e o de remontar ao
fundamento que o torna possível.
Para Kant
o juízo estético não é um atributo da razão e sim da imaginação. Ele divide a beleza em duas espécies: a beleza
livre, que não depende de nenhum conceito de perfeição ou uso; e a beleza
dependente, que depende desses conceitos atributivos. Porém, há uma relação
precisa e clara entre elas , pois os juízos estéticos estão relacionados com a
beleza livre.
A beleza,
o belo artístico, estético é diferente do belo, da beleza ontológica, pois a beleza
ontológica não pode ser uma propriedade objetiva das coisas, mas é fruto de algo
que nasce da relação entre o sujeito e o objeto, é fruto do prazer de nossas
mentes. Além disso, é uma propriedade que nasce da relação dos objetos
comparados com o nosso sentimento de prazer e que nós atribuímos aos próprios
objetos.
Tanto
Platão quanto os demais filósofos clássicos, tentaram fundamentar a
objetividade da arte e da beleza. Platão afirmava que a beleza é a única idéia
que resplandece no mundo. Segundo a idéia platônica, somos obrigados a admitir
a existência do “belo em si” independente das obras individuais que, na medida
do possível, deve aproximar-se da idéia universal. Ou seja, não há sentido no
subjetivismo pessoal da beleza, ela deve estar atrelada a idéia de
universalidade.
Para os
classistas, o belo é deduzido, estabelecido pelas regras do fazer artístico que
se funda a partir do belo ideal, fundado na estética normativa. Estabelecendo
qualidade que o torna mais ou menos agradável, independente do sujeito que a
percebe. Posteriormente, contrapondo essa idéia, os filósofos empiristas Locke
e Hume relativizam a beleza, tendo em vista que ela não é uma qualidade das
coisas, mas só o sentimento da mente de quem a contempla. Assim, o julgamento
do belo, da beleza depende somente da presença ou ausência de prazer em nossas
mentes. A visão do belo, a atribuição de qualidade ao belo e ou a beleza,
podemos assim dizer depende do “estado de espírito” da pessoa, na opinião dos
filósofos empiristas.
Para
Nunes a imagem do objeto referida ao sentimento de prazer, comparada a este e
por este avaliada dá lugar ao juízo de gosto, assim definido:
O juízo de gosto ou
estético é universalizável: o seu objeto provoca a adesão de outros sujeitos
conscientes, na medida em que o prazer desinteressado não é uma satisfação
confinada ao que particulariza como indivíduo, mas depende da capacidade de
sentir e de pensar, comum a todos os homens. (NUNES 2002, p.49).
Para Immanuel
Kant belo é aquilo que agrada universalmente, e não tem conceito definido. O
prazer do belo é universal porque vale para todos os homens e, portanto, se
distingue dos gostos individuais; entretanto, essa universalidade não é de
caráter conceitual ou cognoscitivo. Trata-se, portanto, de uma universalidade
“subjetiva”, no sentido de que vale para cada sujeito.
Diante do
belo da natureza, nós percebemos como que a presença de um desígnio intencional
pelo qual o objeto belo se configura como obra de arte. Ao contrário, diante de
uma obra de arte, que segue um desígnio intencional, nós sentimos que ela é
verdadeiramente bela quando aquela intencionalidade se oblitera e o objeto
parece uma criação espontânea da natureza.
Segundo o
pensador Mareau-Ponty arte é advento,
a espera, um vir a ser do que nunca antes existiu, como promessa infinita de
acontecimentos: as obras dos artistas. No poema (ensaio) A linguagem indireta e as vozes do silêncio, ele escreve:
O primeiro desenho nas
paredes das cavernas fundava uma tradição porque recolhia uma outra: a
percepção. A quase eternidade da arte confunde-se com a quase eternidade da
existência humana encarnada e por isso temos, no exercício de nosso corpo e de
nossos sentidos, com que compreender nossa gesticulação cultural, que nos
insere no tempo. (Marleau-Ponty).
O texto nos faz refletir que o artista é aquele que recolhe de maneira
nova e inusitada aquilo que está na percepção de todos e que, no entanto,
ninguém parece perceber. O artista apresenta um mundo existente, porém não
percebido, mas de qualquer forma nos apresenta um mundo novo, visto pelos olhos
e mãos daquele que o expressa assim como o vê.
O poeta Alberto Caeiro, se expressa dizendo que a arte apresenta um mundo
novo e eterno, pois o eterno é ausência do tempo, quilo que fora do tempo,
permanece sempre idêntico a si mesmo, enquanto o novo é pura temporalidade,
puro movimento temporal em que surge o que não havia antes. Porém esse antes
não existente, refere-se ao não percebido, ao não perceptível. Vejamos o poema:
O meu olhar é nítido como um
girassol.
Tenho o costume de andar pelas
estradas
Olhando par a direita e par a
esquerda,
E de vez em quando olhando para
trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha
visto,
E eu sei dar por isso muito
bem...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao
nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo.
Uma vez
que reunidas as duas qualidades, parecidas em contraste, mas não convergentes,
podemos dizer que no belo, da natureza ou da arte, é preciso que exista e não
exista fim, ou seja, exista como se não existisse, isto é, que a
intencionalidade e a espontaneidade estejam fundidas de tal maneira que a
natureza pareça arte e a arte pareça natureza.
Portanto,
o belo é aquilo que é reconhecido, sem conceito, como objeto de prazer
necessário. Trata-se, obviamente, não de uma necessidade lógica, mas sim
subjetiva, no sentido de que se trata de algo que se impõe a todos os homens,
mas, ao mesmo tempo individualmente.
O belo e o sublime: submissos ao crivo do gosto
Antes de adentrarmos no que seja o belo e o
sublime, é preciso fundamentar, pautar, dizer o que é a verdade. Pois esses
conceitos: belo, feio, sublime, beleza... Estão submissos ao gosto e este é
determinado pela verdade. A estética é fundamental porque a beleza é um dos
fundamentos da verdade.
A
necessidade da arte, ou sua compreensão, não poderá se tornar um conceito real,
se não passar pelo crivo do que seja o gosto. O gosto é uma característica
individual e particular que pode ser analisada sob a ótica da estética. Mas,
qual é o gosto adequado? O que é a beleza? Existe um critério universal dela? Tão
subjetivo quanto o gosto é a referência do que seja o belo e o feio, pois são
categorias interligadas com a idéia de verdade.
Então o
que é verdade?
Para Kant
a verdade é decisão ou deliberação orientada por um valor. Ou seja, quando o
conhecimento é adequado ao seu objeto. É estar de acordo com os fatos ou a
realidade.
Kant
distingue o belo do sublime dizendo que ambos nascem de uma relação que
desperta no sujeito um sentimento. Só que o fundamento do belo é objetivo, é
dado pelo objeto e desperta no sujeito um sentimento de satisfação, de prazer.
Desta forma, o belo é aquilo que é moldado com perfeição ao seu fim e, que
consequentemente é determinado pelo sujeito. Belo, portanto, é uma qualidade
que atribuímos aos objetos para exprimir um estado de nossa subjetividade[1], sendo assim, não há idéia do belo nem regras para se produzi-lo.
Em sua obra de 1764:
Observações sobre o sentimento do belo e do sublime, Immanuel Kant, propõe ao
leitor a observar, sob escolhas próprias, o sentimento do belo e do sublime e,
em especial, analisar as influências que o côngruo social pode infligir sobre
esta visão e sentidos. Diz o autor que o ser humano baliza sua conduta pela
crítica externa, pois vive num corpo social e segue o estatuto que o conduz, o
qual é socialmente aceitável e previamente escolhido. Por isso, para que as
idéias e os conceitos do sentimento do belo e do sublime sejam seguidos, os
vícios e fraquezas morais necessitam ser combatidos, com princípios universais
de benesses. Isso torna uma ação justa melhor identificável. Na Obra "Observações",
o sentimento moral é associado à conduta do homem justo em relação às outras
modalidades de conduta, que interagem com ele, surgindo espaço para o
sentimento de pudor. Desta forma Kant se propõe à descrição das condutas
humanas, a fim de acender a um ponto que capte o todo da natureza humana, de
maneira que possa ser conhecido o princípio moral universalizado e este, esteja
aos olhos de todos, promovendo a perfeição moral. Sendo assim, a idéia de belo para Kant está
associado a organização social tem um caráter eminentemente de justiça e moral.
Isso nos impõe a repensar as implicações dessa interpretação no juízo do gosto,
ponto seqüencial na discussão kantiana, depois de definido como o sentimento do
belo e do sublime manifestam suas propriedades empiricamente nas ações humanas.
Não podemos dar uma
definição clara, exata ou absoluta do belo, contudo, podemos estudar suas
várias acepções no curso da história. A problemática, a dificuldade de
conceituar o belo acompanha a história da filosofia e da humanidade, desde a
Grécia Antiga. Já dizia Sócrates “que toda beleza é difícil". Sem querer
ou pretender recuperar as discussões sobre o que é belo, pode-se trabalhar com
duas ênfases que recortam as reflexões sobre o belo na tradição filosófica: uma
a partir de Aristóteles que o define como idéia objetiva (na Metafísica,
afirma: "As principais formas de beleza são a ordem e a simetria e a
definição clara") e outra para a qual a beleza é determinada pela
experiência de prazer suscitada pelas coisas belas (nos termos de Platão, em O
Banquete). Kant (1724 - 1804), na Crítica do Juízo (1790), propõe
a superação da polaridade ao distinguir a beleza de qualquer juízo racional ou
moral, como veremos logo mais. Desse modo, defende o caráter não determinado do
juízo estético. Segundo Kant, quando se afirma que algo é belo isso é feito sem
ter por base um conceito que respeite essa afirmação, ainda
que supostamente seja válida para todos.
O duplo modo de
conceituação da beleza é utilizado ao longo da história da arte, desde a Grécia
Antiga. Ele é reanimado na oposição entre o belo clássico - objetivo,
universal e imutável - e o belo romântico - que se refere ao
subjetivo, ao variável e ao relativo.
Sendo assim ao que se refere no âmbito do Belo, dois aspectos fundamentais
podem ser particularmente destacados:
1.
A
estética iniciou-se como teoria
que se tornava ciência normativa às custas da lógica
e da moral
- os valores humanos fundamentais: o verdadeiro, o bom, o belo. Centrava em
certo tipo de julgamento de valor que enunciaria as normas gerais do belo;
- A estética assumiu características também de uma metafísica
do belo, que se esforçava para desvendar a fonte original de todas as
belezas sensíveis: para Platão um reflexo do inteligível na matéria, para
Hegel uma manifestação sensível da idéia o belo natural e o belo
arbitrário ou humano
Para Kant, a estética é
um estado de vida de direito próprio, uma capacidade de fruição intimamente
relacionada a outras capacidades cognitivas do ser humano, sem depender,
necessariamente, da aquisição de conhecimento, ou seja: para contemplar o belo,
o sujeito não se vale das determinações das capacidades cognitivas das
faculdades do conhecimento. Na percepção do objeto, o sujeito abarca a
plenitude de suas características e não as características isoladas.
Mesmo que essa associação
possa dar a ilusão de que o sujeito fique, de certo modo "preso" ao
objeto por conta de sua capacidade perceptiva, de acordo com Kant nessa
percepção estética, o sujeito se liberta das imposições do conhecimento
conceitual. Essa liberdade nos permite, segundo Martin Seel, "experimentar
a determinabilidade de nós mesmos no mundo" e ainda completa que Kant:
Vê na experiência do belo (e mais ainda do sublime)
a realização das capacidades mais elevadas do ser humano. A riqueza do real
admitida na contemplação estética é experimentada como afirmação prazerosa de
sua ampla determinabilidade por nós. (Seel, 2004).
Assim podemos
entender que os sentimentos de prazer e desprazer em Kant estão ligados as sensações
estéticas e pertencem ao sujeito, como algo subjetivo, mas inerente ao próprio
ser, e são estes sentimentos subjetivos,
não lógicos
que emitem o conceito do belo, são eles que formam o juízo do gosto, do belo e bonito.
Por isso, a percepção de um objeto ou fenômeno que instiga a sensação de prazer
provoca a fruição ou gozo e a essas sensações damos os nomes de belo, bonito e
beleza. A questão do belo seria então algo subjetivo, e por ser subjetivo é
livremente atribuído, sem parâmetro, fundado na “norma pessoal”, no “eu
pessoal”. São os sentimentos oriundos das sensações agradáveis que emitem o
juízo do belo, induzindo o desejo de permanecer usufruindo tais sensações. O
interesse imediato diante das sensações prazerosas é a continuidade. A partir
desse “espanto”, dessa “admiração”, a arte constituísse em passagem do instituido para o instituinte, ou seja, uma transfiguração do existente numa outra
realidade que oa faz renascer e ser de maneira inteiramente nova.
REFERÊNCIA
ARANHA, Maria Lucia de Arruda. MARTINS. Maria
Helena Pires. Filosofando: Introdução à
Filosofia. Vol. Único. Ed. Moderna. São Paulo, 2009.
CHAUÍ, Marilena. Iniciação à Filosofia. Vol. Único. Ed. Ática. São Paulo, 2011.
COTRIM, Gilberto. FERNANDES, Mirna. Fundamentos de Filosofia. Vol.Único. Ed.
Saraaiva. São Paulo, 2010.
KANT, Immanuel. Crítica da faculdade do juízo. Tradução de Valério Rohen. Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 1993.
NUNES, Benedito. Introdução à Filosofia da Arte, Editora Ática, São Paulo, 2002, p.
49.
SEEL,
Martin. A libertação da estética filosófica por Kant.Tradução de Alfred Keller;
Goethe Institut, 2004.
[1]
João Bôsco Almeida Cruz é Mestrando
em Ciências da Religião pela PUCGO, Graduado em Filosofia pela PUCSP e Teologia
pela PUCGO, é especialista no Ensino de Filosofia e Sociologia pela Faculdade
de Tecnologia e Ciência/2009. Professor de Filosofia e Antropologia Jurídica na
FESURV, de Filosofia e Ética Profissional, Filosofia da Educação, Fundamentos
Filosóficos para Serviço Social, Sociologia e Antropologia nas Faculdades
Unidas do Vale do Araguaia, Professor de História e Geografia no Colégio
Monteiro Lobato em Barra do Garças/MT e, professor de Filosofia, Sociologia e
Ensino Religioso na rede pública do Estado do Mato Grosso. E-mail:
bosco_cruz@hotmail.com
[1]
Entende-se subjetividade por mundo interno de cada ser (pessoa), aquilo que é
próprio (particular) de cada indivíduo.
show de bola professor
ResponderExcluirroberto langer jr
2c