quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011

FESURV AULA 02 - ORIGEM E DEFINIÇÃO DA FILOSOFIA

FESURV
UNIVERSIDADE DE RIO VERDE
CAMPI CAIAPONIA
Disciplina: Filosofia Jurídica
Docente: Mestrando João Bôsco
Aula 02                         Data: 18/02/2011                          
Turma: 2º Período de Direito


Tema: ORIGEM E DEFINIÇÃO DA FILOSOFIA

A cada dia que passa é maior a necessidade de que os indivíduos sejam sujeitos de si mesmos, sujeitos conscientes de sua história. Até mesmo o mercado já exige um perfil profissional que supõe uma mão de obra criativa e atuante, e não mais meros executores de tarefas.
A preocupação, para além do mercado, é com a formação de um indivíduo crítico e responsável socialmente pelos seus atos.
A possibilidade da formação deste indivíduo deve ser viabilizada para o adolescente e o jovem. Ela não se dá espontaneamente. Uma das formas de viabilizá-la é através do processo ensino-aprendizagem das ciências, da filosofia, das artes, e da experiência de vida de cada um.
Neste contexto, cabe à Filosofia garantir não só a visão de totalidade da história e do processo do conhecimento, sem negar a necessidade de especialização hoje imposta, mas também desenvolver no educando - junto com outras disciplinas - a sua capacidade de buscar, através da leitura, da observação, da percepção de transformações ocorridas a partir da sua própria interferência em situações sociais, o melhor caminho historicamente possível para a organização da vida em sociedade.
Desta forma, um curso de Filosofia busca fornecer ao adolescente o instrumental básico à elaboração de uma reflexão sobre o mundo, e sobre si mesmo no mundo, de forma a possibilitar-lhe a conquista de uma autonomia crescente no seu pensar e agir.
Desta forma, ao aprender Filosofia, espera-se que a pessoa:

- aprenda conceitos, sabendo relacioná-los entre si e aplicá-los em sua realidade;
- reconheça-se como ser produtor de cultura e, portanto, da história;
- compreenda a produção do pensamento como enfrentamento dos desafios humanos;
- compreenda o papel da reflexão, em especial, o da filosófica;
- saiba construir "universos" históricos de diferentes tempos em seu pensamento, sem preconceitos;
- situe-se como cidadão no mundo em que vive, percebendo o seu caráter histórico e a sua dimensão de liberdade;
- compreenda o conhecimento como possibilidade de libertação social;
- compreenda o pensamento do seu mundo como síntese de diferentes culturas anteriores e concomitantes a ele;
- elabore criticamente seu próprio pensar a partir de notícias/análises de jornais/revistas e de suas vivências concretas.

A ORIGEM DO TERMO FILOSOFIA
Uma definição precisa do termo "filosofia" é impraticável. Tentar formulá-la poderia, ao menos de início, gerar equívocos. Com alguma espirituosidade, alguém poderia defini-la como "tudo e nada, tudo ou nada...". Melhor dizendo, a filosofia difere das ciências especiais na medida em que procura oferecer uma imagem do pensamento humano - ou mesmo da realidade, até onde se admite que isso possa ser feito - como um todo. Contudo, na prática, o conteúdo de informação real que a filosofia acrescenta às ciências especiais tende a desvanecer-se até parecer não deixar vestígios.
Acredita-se que esse desvanecimento seja enganoso. Mas deve-se admitir que até aqui a filosofia não tem conseguido realizar suas grandes pretensões. Tampouco tem logrado êxito em produzir um corpo de conhecimentos consensual comparável ao elaborado pelas diversas ciências. Isso se deve em parte, embora não integralmente, ao fato de que, quando obtém-se conhecimento verdadeiro a respeito de determinada questão situa-se essa questão como pertencente à ciência e não à filosofia.
O termo "filósofo" significava originariamente "amante da sabedoria", tendo surgido com a famosa réplica de Pitágoras aos que o chamavam de "sábio". Insistia Pitágoras em que sua sabedoria consistia unicamente em reconhecer sua ignorância, não devendo portanto ser chamado de "sábio", mas apenas de "amante da sabedoria".
Nessa acepção, "sabedoria" não se restringia a qualquer dos domínios particulares do pensamento e, de modo similar, "filosofia" era usualmente entendida como incluindo o que hoje denomina-se "ciência". Esse uso sobrevive ainda hoje em expressões como "filosofia natural".
Na medida em que uma grande produção de conhecimento especializado em um dado campo ia sendo conquistada, o estudo desse campo se desprendia da filosofia, passando a constituir uma disciplina independente. As últimas ciências que assim evoluíram foram a psicologia e a sociologia. Dessa forma, poder-se-is falar de uma tendência à contração da esfera da filosofia na própria medida em que o conhecimento se expande. Recusa-se a considerar filosóficas as questões cujas respostas podem ser dadas empiricamente.
Não deseja-se com isso sugerir que a filosofia poderá acabar sendo reduzida ao nada. Os conceitos fundamentais das ciências, da figuração geral da experiência humana e da realidade (na medida em que se formam crenças justificadas a seu respeito) permanecem no âmbito da filosofia, visto que, por sua própria natureza, não podem ser determinados pelos métodos das ciências especiais.
É sem dúvida desencorajador que os filósofos não tenham logrado maior concordância com respeito a esses assuntos, mas não se deve concluir que a inexistência de um resultado por todos reconhecido signifique que esforços foram realizados em vão. Dois filósofos que discordem entre si podem estar contribuindo com algo de inestimável valor, embora ambos não estejam em condição de escapar totalmente ao erro: suas abordagens rivais podem ser consideradas mutuamente complementares.
O fato de filósofos distintos necessitarem dessa mútua complementação torna evidente que o ato de filosofar não é unicamente um processo individual, mas também um processo que possui uma contrapartida social.
Um dos casos em que a divisão do trabalho filosófico se torna bastante proveitosa consiste na circunstância de que pessoas distintas usualmente enfatizam aspectos diferentes de uma mesma questão. Contudo, boa parte da filosofia volta-se mais para o modo pelo qual conhecemos as coisas do que propriamente para as coisas que conhecemos, sendo essa uma segunda razão pela qual a filosofia parece carecer de conteúdo. No entanto, discussões a respeito de um critério definitivo de verdade podem determinar, na medida em que recomendam a aplicação de um dado critério, quais as proposições que na prática delibera-se serem verdadeiras. As discussões filosóficas da teoria do conhecimento têm exercido, ainda que de modo indireto, importante efeito sobre as ciências.

UTILIZAÇÃO DA FILOSOFIA

Para Platão, a filosofia é o uso do saber em proveito do homem. Isso implica a posse ou aquisição de um conhecimento que seja, ao mesmo tempo, o mais válido e o mais amplo possível; e também o uso desse conhecimento em benefício do homem. Essa definição, porém, exige a uma definição de benefício, que por sua vez exige uma definição de Bem. Para saber o que é o Bem, entretanto, também é necessário descobrir o que é a Verdade.
Alguns filósofos, definem a filosofia como a busca do Bem, da Verdade, do Belo e de como os homens podem conhecer essas três entidades. Portanto, a filosofia toma para si a árdua tarefa de debater problemas ou especular sobre problemas que ainda não estão abertos aos métodos científicos: o bem e o mal, o belo e o feio, a ordem e a liberdade, a vida e a morte.
Leia um exemplo de texto filosófico, em que um filósofo norte-americano, John Dewey, procura refletir justamente sobre o que é senso comum:

Visto que os problemas e as indagações em torno do senso comum dizem respeito às interações entre os seres vivos e o ambiente, com o fim de realizar objetos de uso e de fruição, os símbolos empregados são determinados pela cultura corrente de um grupo social. Eles formam um sistema, mas trata-se de um sistema de caráter mais prático que intelectual. Esse sistema é constituído por tradições, profissões, técnicas, interesses e instituições estabelecidas no grupo. As significações que o compõem são efeito da linguagem cotidiana comum, com a qual os membros do grupo se intercomunicam. "Lógica", VI, 6, J. Dewey

Há uma questão que muita gente formula de imediato quando ouve falar de filosofia: qual a utilidade da filosofia? Não há certamente expectativa alguma de que ela contribua para a produção de riqueza material. Contudo, a menos que se suponha que a riqueza material seja a única coisa de valor, a incapacidade da filosofia de promover esse tipo de riqueza não implica que não haja sentido prático em filosofar. Não valoriza-se a riqueza material por si própria - aquela pilha de papel que se chama de dinheiro não é boa por si mesma -, mas por contribuir para a felicidade de cada um. Não resta dúvida de que uma das mais importantes fontes de felicidade, ao menos para os que podem apreciá-la, consiste na busca da verdade e na contemplação da realidade; eis aí o objetivo do filósofo. Ademais, aqueles que, em nome de um ideal, não classificaram todos os prazeres como idênticos em seu valor, tendo chegado a experimentar o prazer de filosofar, consideraram essa experiência como superior em qualidade a qualquer outra. Visto que a maior parte dos bens que a indústria produz, excetuando os que suprem as necessidades básicas, valem apenas como fontes de prazer, torna-se a filosofia perfeitamente apta, no que se refere à utilidade, para competir com a maioria dos produtos industriais, quando poucos são os que podem dedicar-se, em tempo integral à tarefa de filosofar.
Mesmo que se entendesse a filosofia como fonte de um inocente prazer particularmente válido por si próprio (obviamente, não apenas para os filósofos, mas também para todos aqueles a quem eles ensinam e influenciam), não haveria razão para invejar tão pequeno desperdício da força humana dedicada ao filosofar.
Não se esgota, porém, tudo o que pode ser dito em favor da filosofia. Pois, à parte de qualquer valor que lhe pertença intrinsecamente acima de seus efeitos, a filosofia tem exercido, por mais que se ignore isso, uma admirável influência indireta até mesmo sobre a vida de gente que nunca ouviu falar nela. Indiretamente, tem sido destilada através de sermões, da literatura, dos jornais e da tradição oral, afetando assim toda a perspectiva geral do mundo. Em grande parte, foi através de sua influência que se fez da religião cristã o que ela é hoje. Deve-se originalmente a filósofos idéias que desempenharam papel fundamental para o pensamento em geral, mesmo em seu aspecto popular, como, por exemplo, a concepção de que nenhum homem pode ser tratado apenas como um meio ou a de que o estabelecimento de um governo depende do consentimento dos governados.  

No âmbito da política, a influência das concepções filosóficas tem sido expressiva. Nesse sentido, a Constituição norte-americana é, em grande parte, uma aplicação das idéias do filósofo John Locke; ela apenas substitui o monarca hereditário por um presidente. Similarmente, admite-se que as idéias de Rousseau tenham sido decisivas para a Revolução Francesa de 1789. É inegável que a influência da filosofia sobre a política pode às vezes ser nefasta: os filósofos alemães do século X1X podem ser parcialmente responsabilizados pelo desenvolvimento de um nacionalismo exacerbado que posteriormente veio a assumir formas bastante deturpadas. Todavia, não resta dúvida de que essa responsabilidade tem sido freqüentemente muito exagerada, sendo difícil determiná-la exatamente, o que se deve ao fato de aqueles filósofos terem sido obscuros. Contudo, se uma filosofia de má qualidade pode exercer influência nefasta sobre a política, com as filosofias de boa qualidade pode ocorrer o contrário. Não há meios de impedir tais influências sendo portanto extremamente oportuno que se dedique especial atenção à filosofia com o intuito de constatar se concepções que exerceram alguma influência foram mais positivas do que nefastas. 0 mundo teria sido poupado de muitos horrores caso os alemães tivessem sido influenciados por uma filosofia melhor que a dos nazistas.
Torna-se, portanto, imperativo abandonar a afirmação de que a filosofia é destituída de valor, mesmo com respeito à riqueza material. Uma boa filosofia, ao influenciar favoravelmente a política, pode gerar uma prosperidade incapaz de ser alcançada sob a égide de uma filosofia inferior. Outrossim, o expressivo desenvolvimento da ciência, com seus conseqüentes benefícios de ordem prática, muito depende de seu background filosófico. Houve mesmo quem tenha chegado a afirmar, talvez exageradamente, que o desenvolvimento da civilização como um todo seria concomitante às mudanças na idéia de causalidade, da concepção mágica de causalidade à científica. De qualquer modo, a idéia de causalidade faz parte do objeto da filosofia. A própria ‘perspectiva científica’, em grande parte, foi introduzida inicialmente pelos filósofos.
Todavia, certamente não se está nas melhores condições para fazer um estudo proveitoso da filosofia se a encarar principalmente como uma via indireta de acesso à riqueza material. A principal contribuição da filosofia consiste no intangível background intelectual do qual muito dependem o clima espiritual e a feição geral de uma civilização. Nesse sentido, ocasionalmente se desenvolvem ambições ainda maiores. Whitehead, um dos mais expressivos e acatados pensadores modernos, descreve os dons da filosofia como "a capacidade de ver e de prever, aliada a um sentido do valor da vida, ou seja, o sentido da importância que anima todo esforço civilizado". Acrescenta ainda Whitehead que, "quando uma civilização atinge seu auge sem coordená-lo com uma filosofia de vida, difundem-se por toda a comunidade períodos de decadência e monotonia, seguidos pela estagnação de todos os esforços". Para ele, a filosofia consiste em "uma tentativa de esclarecer as crenças que, em última instância, determinam nossa atenção, a qual integra a base de nosso caráter". De um modo ou de outro, pode-se ter como certo que o caráter de uma civilização é enormemente influenciado por sua concepção geral da vida e da realidade. Até pouco tempo, para a maioria das pessoas, essa concepção era proporcionada pelo ensino religioso, mas as próprias concepções religiosas foram muito influenciadas pelo pensamento filosófico. Ademais, a experiência demonstra que as concepções religiosas podem conduzir à loucura, a menos que sejam continuamente submetidas a uma avaliação racional. Os que rejeitam qualquer concepção religiosa devem ter o maior interesse em elaborar uma nova concepção para, se possível, substituir a crença religiosa. E fazê-lo significa engajar-se na filosofia.
Embora não possa substituir a filosofia, a ciência suscita problemas filosóficos. Pois ela não pode dizer que lugar ocupam os fatos com que lida no esquema geral das coisas, não conseguindo nem mesmo esclarecer suas relações com os espíritos que os observam. Nem mesmo pode demonstrar, embora deva admitir, a existência do mundo físico ou a legitimidade do uso dos princípios da indução para prever as prováveis ocorrências futuras ou ultrapassar de alguma forma o que tem sido efetivamente observada. Nenhum laboratório científico pode demonstrar em que sentido os homens têm uma alma, se o universo tem ou não um propósito, se, e em que sentido, se é livre, e assim por diante. Não deseja-se com isso sugerir que a filosofia possa resolver esses problemas; no entanto, se ela realmente não puder, nada mais poderá fazê-lo, sendo certamente válido tentar descobrir ao menos se tais problemas podem ser solucionados. Vê-se que a própria ciência pressupõe continuamente conceitos que subsumem os domínios da filosofia e, da mesma forma que nenhuma ciência pode florescer se não admitir-se tacitamente uma resposta para certas questões filosóficas, não se pode fazer uso mental adequado da ciência, com o intuito de implementar o desenvolvimento intelectual, sem admitir uma visão de mundo mais ou menos coerente. Mesmo as melhores conquistas da ciência moderna não teriam sido alcançadas se os cientistas não tivessem adotado determinadas suposições de grandes e originais filósofos, nas quais basearam todo o seu proceder. A concepção "mecanicista" do universo, que caracterizou a ciência durante os últimos três séculos, é derivada principalmente do filosofia de Descartes. Por ter ocasionado maravilhosos resultados, o esquema mecanicista deve ser, em parte, verdadeiro, ainda que parcialmente inadequado, apressando-se o cientista em buscar no filósofo o necessário auxílio para erigir novo esquema que possa substituir o antigo.
Um segundo serviço inestimável prestado pela filosofia (especialmente pela "filosofia crítica") reside no hábito, por ela estimulado, de promover-se um julgamento imparcial considerando-se todas as facetas de uma questão, e na idéia que ela oferece do que seja a evidência e de que se deve buscar ou esperar de uma prova. Pode ser esse um importante questionamento das inclinações emocionais e das conclusões precipitadas, sendo especialmente necessário, e com freqüência negligenciado, em controvérsias políticas. Se ambos os lados considerassem suas diferenças políticas munidos de espírito filosófico, seria difícil admitir a eventualidade de uma guerra. O sucesso da democracia depende muito da habilidade dos cidadãos em distinguir um bom de um mau argumento, não se deixando enganar por confusões. A filosofia crítica estabelece um padrão ideal para o raciocínio correto e capacita quem a estuda a remanejar argumentos confusos. Talvez seja essa a motivação pela qual Whitehead afirma, na passagem acima citada, que "nenhuma sociedade democrática poderá alcançar êxito sem que a educação geral que a inspire exprima uma perspectiva filosófica".
Na medida em que se admite que certa cautela é desejável ao se afirmar que os homens não deixam de viver de acordo com uma filosofia na qual acreditam, e enquanto atribuir-se a maior parte dos desacertos humanos exatamente à falta desse desejo de sintonia com ideais mais nobres, não dará para negar a extrema relevância de crenças gerais a respeito da natureza do universo e do bem para a determinação da progresso ou da degeneração da humanidade. Algumas partes da filosofia inegavelmente produzem resultados práticos mais expressivos, mas não deve-se por isso incorrer no erro de supor que a aparente inexistência de um suporte de ordem prática para determinado campo de estudo implica que a investigação desse campo seja destituída de sentido prático. Conta-se que um cientista, que costumava jactar-se de desprezar a dimensão prática de toda pesquisa, disse certa vez a respeito de uma: "0 melhor disso tudo é que ela possivelmente não revelará qualquer utilidade prática para quem quer que seja." Todavia, essa linha de pesquisa acabou levando à descoberta da eletricidade.
De modo similar, estudos filosóficos por demais acadêmicos e aparentemente destituídos de utilidade prática terminam por exercer profunda influência sobre a visão de mundo, chegando até mesmo a afetar, em última instância, a ética e a religião que se adota. Pois as diferentes partes da filosofia, os diferentes elementos que compõem a visão de mundo, deveriam integrar-se. Tal é pelo menos o objetivo, nem sempre alcançável, de uma boa filosofia. Sendo assim, conceitos à primeira vista muito distanciados de qualquer interesse de ordem prática podem vir a afetar de modo vital outros conceitos que envolvem mais de perto a vida diária.
Pode-se compreender agora o motivo pelo qual a filosofia não precisa recear a questão de ter ou não valor prático. Deve-se ao mesmo tempo dizer que não aprova-se de modo algum uma concepção puramente pragmática da filosofia. A filosofia merece ser valorizada por si própria, e não por seus efeitos indiretos de ordem prática. E a melhor maneira de se assegurar esses bons efeitos práticos é se dedicar à filosofia pela filosofia. Para encontrar a verdade, precisa-se buscá-la desinteressadamente. E o fato de a encontrar se revelará muito útil do ponto de vista prático. Não obstante, uma preocupação prematura com seus efeitos práticos só dificultará a busca do que é de fato verdadeiro. Muito menos pode-se fazer desses efeitos práticos o critério de sua verdade. As crenças são úteis porque são verdadeiras, e não verdadeiras porque são úteis.


PRINCIPAIS DIVISÕES DA FILOSOFIA

Tradicionalmente, a filosofia se divide em cinco áreas:

1. Lógica, que estuda o método ideal de pensar e investigar;
2. Metafísica, que estuda a natureza do Ser (ontologia), da mente (psicologia filosófica) e das relações entre a mente e o ser no processo do conhecimento (epistemologia);
3. Ética, que estuda o Bem, o comportamento ideal para o ser humano;
4. Política, que estuda a organização social do homem;
5. Estética, que estuda a beleza e que pode ser chamada de filosofia da Arte.

Convém concluir lembrando que a ciência e o pensamento científico se originaram com a filosofia na Grécia da Antigüidade. Com o passar do tempo, certas áreas da especulação filosófica, como a matemática, a física e a biologia ganharam tal especificidade que se separaram da filosofia.

FILOSOFIA E SABEDORIA PRÁTICA

A filosofia está associada tanto ao saber teórico quanto à sabedoria prática, à qual se alude através de expressões do tipo "considerar filosoficamente as coisas". De fato, o sucesso da filosofia teórica não oferece qualquer garantia de que será filósofo no sentido prático ou de que agiré e sentirá de modo correto sempre que se envolver em determinadas situações práticas. Uma das doutrinas favoritas de Sócrates é a de que sempre se pode fazer o bem desde que se saiba o que é o bem; não obstante, isso só é verdade se acrescentar ao significado do termo "saber" uma adequada nitidez emocional daquilo que se sabe do ponto de vista teórico. 0 fato de saber (ou acreditar) que fazer algo que se deseja iria acarretar muito mais sofrimento a uma outra pessoa do que prazer para si mesmo, sendo, em conseqüência, não-recomendável, não impede, todavia, de praticar tal ação, pois a idéia de causar sofrimento poderia parecer menos repugnante que a de perder aquilo que se cobiça. Na medida em que é inteiramente impossível a qualquer ser humano sentir o sofrimento alheio com a mesma intensidade que os seus, ocorre sempre a possibilidade de ser tentado a abandonar os deveres, fazendo-se necessário não apenas o conhecimento, mas também o exercício da vontade. Nem se é constituído de modo a ser sempre fácil, quando se é abandonado à própria moral, se opor a um forte desejo, ainda que disso dependa a própria felicidade. A filosofia não é garantia de conduta correta ou do perfeito ajustamento das emoções às crenças filosóficas. Nem mesmo do ponto de vista cognitivo é ela capaz de dizer o que se deve fazer. Para isso, precisa-se, além de princípios filosóficos, não só do conhecimento empírico dos fatos relevantes e da capacidade de prever as prováveis conseqüências, mas também de um insight da situação particular, de maneira a se poder aplicar adequadamente os princípios.
MITO E SUA NECESSIDADE

Definição de Mito
Segundo Mircea Eliade, a tentativa de definir mito é a seguinte, “o mito é uma realidade cultural extremamente complexa, que pode ser abordada e interpretada em perspectivas múltiplas e complementares....o mito conta uma história sagrada, relata um acontecimento que teve lugar no tempo primordial, o tempo fabuloso dos começos...o mito conta graças aos feitos dos seres sobrenaturais, uma realidade que passou a existir, quer seja uma realidade tetal, o Cosmos, quer apenas um fragmento, uma ilha, uma espécie vegetal, um comportamento humano, é sempre portanto uma narração de uma criação, descreve-se como uma coisa foi produzida, como começou a existir...”
O mito só fala daquilo que realmente aconteceu do que se manifestou, sendo as suas personagens principais seres sobrenaturais, conhecidos devido aquilo que fizeram no tempo dos primordios. Os mitos revelam a sua actividade criadora e mostram a “sobrenaturalidade” ou a sacralidade das suas obras. Em suma os mitos revelam e descrevem as diversas e frequentemente dramáticas eclosões do sagrado ou sobrenatural nomundo. É está “intormição” ou eclosão do sagrado(sobrenatural), que funda, que dá origem ao mundo tal como ele é hoje. Sendo também graças à intervenção de seres sobrenaturais que o homem é o que é hoje.
Ainda segundo Mircea Eliade, “o mito é considerado como uma história sagrada, e portanto uma história verdadeira, porque se refere sempre a realidades. O mito cosmogónico é verdadeiro porque a existência do mundo está aí para o provar, o mito da origem da morte é também verdadeiro porque a mortalidade do homem prova-o...e pelo facto de o mito relatar as gestas dos seres sobrenaturais e manifestações dos seus poderes sagrados, ele torna-se o modelo exemplar  de todas as actividades humanas significativas”. 
A Nessecidade do Mito
 
        Muitas histórias mitológicas conservam-se na mente das pessoas, dando uma certa, perspectiva daquilo que acontecia em suas vidas.
“Essas informações provenientes de tempos antigos têm a ver com os temas que sempre deram sustentação à vida humana, construíram, civilizações e formaram religiões através dos séculos, e têm a ver com os profundos problemas interiores, com os profundos mistérios, com os profundos limiares da nossa travessia pela vida...”
Aquilo que os seres humanos têm em comum revela-se no mito. Segundo Campbell, eles são histórias da nossa vida, da nossa busca da verdade, da busca do sentido de estarmos vivos. Os mitos são pistas para as potencialidades espirituais da vida humana, daquilo que somos capazes de conhecer e experimentar interiormente. O mito é o relato a experiência da vida. Eles ensinam que nós podemos voltar-nos para dentro.
Assim sendo os mitos têm como tema principal e fundamental que é a busca da espiritualidade interior de cada um de nós.
“Os mitos estão perto do inconsciente colectivo e por isso são infinitos na sua revelação”.
 As Características do Mito
A narração mitológica envolve basicamente acontecimentos supostos, relativos a épocas primordiais, ocorridos antes do surgimento dos homens (história dos deuses) ou com os "primeiros" homens (história ancestral). O verdadeiro objecto do mito, contudo, não são os deuses nem os ancestrais, mas a apresentação de um conjunto de ocorrências fabulosas com que se procura dar sentido ao mundo. O mito aparece e funciona como mediação simbólica entre o sagrado e o profano, condição necessária à ordem do mundo e às relações entre os seres. Sob sua forma principal, o mito é cosmogônico ou escatológico, tendo o homem como ponto de intersecção entre o estado primordial da realidade e sua transformação última, dentro do ciclo permanente nascimento-morte, origem e fim do mundo.
As semelhanças com a religião mostram que o mito se refere -- ao menos em seus níveis mais profundos -- a temas e interesses que transcendem a experiência imediata, o senso comum e a razão: Deus, a origem, o bem e o mal, o comportamento ético e a escatologia (destino último do mundo e da humanidade). Crê-se no mito, sem necessidade ou possibilidade de demonstração. Rejeitado ou questionado, o mito se converte em fábula ou ficção.
  Tipos de Mito
Mitos cosmogônicos 
Dentre as grandes interrogações que o homem permanece incapaz de responder, apesar de todo o conhecimento experimental e analítico, figura, em todas as mitologias, a da origem da humanidade e do mundo que habita. É como resposta a essa interrogação que surgem os mitos cosmogônicos. As explicações oferecidas por esses mitos podem ser reduzidas a alguns poucos modelos, elaborados por diferentes povos. 
É comum encontrar nas várias mitologias a figura de um criador, um demiurgo que, por ato próprio e autónomo, estabeleceu ou fundou o mundo em sua forma atual. Os mitos desse tipo costumam mencionar uma matéria preexistente a toda a criação: “o oceano, o caos (segundo Hesíodo) ou a terra (nas mitologias africanas). A criação ex nihilo (a partir do nada, sem matéria preexistente) já reflecte algum tipo de elaboração filosófica ou racional. A cosmogonia chinesa, por exemplo, atribui a origem de todas as coisas a Pan Gu, que produziu as duas forças ou princípios universais do yin e yang, cujas combinações formam os quatro emblemas e os oito trigramas e, por fim, todos os elementos”.
No hinduísmo, o Rigveda descreve graficamente o nada a original , no qual respirou o Um, nascido do poder do calor.
A água é o elemento primordial mais frequente das cosmogonias, sobretudo nas mitologias asiáticas e da América do Norte. A consolidação da terra faz-se pela acção de um intermédio (espirito ou animal) que a retira do fundo da água e introduz no mundo um elemento de desordem ou mal.
A criação a partir do nada,  aparece unicamente pela palavra de deus facto que aparece claramente no livro do Génesis.   
Mitos escatológicos
Ao lado da preocupação com o enigma da origem, figura para o homem, como grande mistério, a morte individual, associada ao temor da extinção de todo o povo e mesmo do desaparecimento do universo inteiro.
            Morte. Para a mitologia, a morte não aparece como fato natural, mas como elemento estranho à criação original, algo que necessita de uma justificação, de uma solução em outro plano de realidade. Três explicações predominam nas diversas mitologias. Há mitos que falam de um tempo primordial em que a morte não existia e contam como ela sobreveio por efeito de um erro, de castigo ou para evitar a superpopulação. Outros mitos, geralmente presentes em tradições culturais mais elaboradas, fazem referência à condição original do homem como ser imortal e habitante de um paraíso terreno, e apresentam a perda dessa condição e a expulsão do paraíso como tragédia especificamente humana. Por fim, há o modelo mítico que vincula a morte à sexualidade e ao nascimento, analogamente às etapas do ciclo de vida vegetal, e que talvez tenha surgido em povos agrícolas.
Já Platão anunciava a reencarnação e a imortalidade da alma na sua obra “Fédom”, acreditando, que as almas dos seres virtuosos iam para junto dos Deuses bons, e no momento da morte a alma separava-se do corpo, permanecendo imperecível. O corpo simbolizava o cárcere da alma, e só a morte a poderia liberta-la desse cárcere, daí a serenidade de Sócrates no momento da sua morte.
.           Destruição escatológica - Os mitos retractam frequentemente o fim do mundo como uma grande destruição, de natureza bélica ou cósmica. Antes da destruição, surge um messias ("ungido") ou salvador, que resgata os eleitos por Deus. Esse salvador pode ser o próprio ancestral do povo ou fundador da sociedade, que empreende uma batalha final contra as forças do mal e, após a vitória, inaugura um novo estágio da criação, um novo céu e uma nova terra.
            Os mitos da destruição escatológica manifestaram-se tardiamente, na literatura apocalíptica judaica, que floresceu entre os séculos II a.C. e II d.C., e deixou sua marca no livro do Apocalipse, atribuído ao apóstolo João. Exemplo típico de mito de destruição (embora não no fim dos tempos) são as narrativas a respeito de grandes inundações. É bastante conhecido o episódio do Antigo Testamento que descreve um dilúvio e o apresenta como castigo de Deus à humanidade. Esse tema tem origens mais remotas e provém de mitos mesopotâmicos. 

Mitos sobre o tempo e a eternidade 
            Os corpos celestes sempre atraíram a curiosidade e o interesse humano, em todas as culturas. A regularidade e precisão inalteráveis do movimento dos astros foram com certeza uma imagem poderosa na formação de uma ideia de "tempo transcendente", concebido como eternidade, em contraste com o mundo de incessantes alterações e os acontecimentos inesperados vividos no tempo terreno. O retorno cíclico dos fenómenos siderais e de processos naturais terrestres projectou-se, em algumas culturas, na concepção cíclica do tempo.
     .      Nas escrituras hinduístas e budistas, elaborou-se um complexo sistema de mundos que desaparecem e ressurgem, sempre num total de quatro. Essa concepção cíclica determinou a adaptação de relatos védicos anteriores e o desenvolvimento de uma doutrina que explica a formação e absorção periódicas do universo como fases de actividade e repouso de energia. Os ascetas e os maias acreditavam que o mundo actual. havia sido precedido de outros quatro, o último dos quais teria sido destruído por um cataclismo; ambos os povos desenvolveram um complicado calendário, a cujo estudo se dedicavam vários sacerdotes astrónomos.
            A concepção linear e progressiva de tempo (oposta à repetição cíclica) é característica
das chamadas religiões históricas -- judaísmo, cristianismo, islamismo --, que afirmam a intervenção de Deus na história, num acontecimento único e irrepetível, e a existência de uma meta final de salvação da humanidade.
 
Mitos de transformação e de transição 
            Numerosos mitos narram mudanças cósmicas, produzidas ao término de um tempo primordial anterior à existência humana e graças às quais teriam surgido condições favoráveis à formação de um mundo habitável. Outras grandes transformações e inovações, como a descoberta do fogo e da agricultura, estão associadas aos mitos dos grandes fundadores culturais. Nos mitos, são frequentes as transformações temporárias ou definitivas dos personagens, seja em outras figuras humanas ou em animais, plantas, astros, rochas e outros elementos da natureza.
            As mudanças e transformações que se dão nos momentos críticos da vida individual e social são objecto de particular interesse mitológico e ritual: nascimento, ingresso na vida adulta, casamento, morte - acontecimentos marcantes para a pessoa e sua comunidade -são interpretados como actualizações de processos cósmicos ou de realidades míticas.
 
  O Eu Transcendente
  O mito está directamente ligado à nessecidade do ser humano se transcender através da sua espiritualidade, das suas crenças, das suas fés. O mito surge então como um guia, como um exemplo, que acalma os “espiritos” mais descontentes com a realidade, ajudando-os a adaptarem-se à sua realidade. Por isso resolvi transcrever o excerto seguinte de  Mihaly Csikszentmihalyi, que penso que descreve bem  a transcendência do eu, e a necessidade do eu transcendente e da espiritualidade Humana:
“Na maior parte das culturas que atingiram a complexidade de civilização, as qualidades tidas em mais alta estima são as envolvidas nos processos mentais  de um caracter particular a que, à falta de melhor palavra chamaremos “espiritual”. As competências espirituais incluem a habilidade de controlar directamente a experiência, manipulando os menes( herança cultural, transmitida ao longo dos séculos), que aumentam a harmonia entre os pensamentos, emoções e vontades da pessoa. Aqueles que exercem estas competências são chamados Xamãs, sacerdotes, filósofos, artistas e homens, ou mulheres, sábios dos mais variados tipos. São respeitados e recordados, e mesmo que não lhes sejam concedidos poder ou dinheiro, os seus conselhos são ouvidos, e a sua própria existência é acarinhada pelas comunidades em que vivem.
À primeira vista, é difícil compreender por que razão as contribuições espirituais são consideradas tão importantes pela maioria das sociedades. De um ponto de vista evolutivo, poderia parecer que não têm qualquer valor  prático em termos de sobrevivência. Os esforços dos agricultores, construtores, comerciantes, cientistas, etc...produzem benefícios óbvios e concretos; e a actividade intelectual o que produz?
O que é comum a todas as formas de espiritualidade é a tentativa de reduzir  a entropia na consciência. A actividade espiritual visa produzir harmonia entre desejos contraditórios, esforça-se por encontrar significado nos acontecimentos casuais da vida e tenta reconciliar os objectivos humanos com as forças que se lhes opõem a partir do meio. Aumenta a complexidade ao clarificar as componentes da experiência individual, tais como o bom e mau, amor e ódio, prazer e dor. procura expressar estes processos em menes que sejam acessíveis a todos e ajuda a integrá-los uns nos outros, bem como , no meio exterior.
Estes esforços para levar harmonia à mente baseiam-se frequentemente, mas não sempre, numa crença em poderes sobrenaturais. Muitas “religiões”orientais, e filosofias estóicas da antiguidade, tentaram desenvolver uma consciência complexa sem o recurso a um ser supremo. Algumas tradições espirituais, com o ioga hindu ou o taoismo, concentram-se exclusivamente em conseguir harmonia e o controlo da mente sem qualquer interesse a entropia social, outras, como a tradição confuciana, visavam primariamente  estabelecer a ordem social. Em todo caso, se a importância  atribuída a estas tentativas pode servir de indicador, a redução do conflito e da desordem através de meios espirituais parece ser muito adaptativa. Sem elas é provável que as pessoas ficassem cada vez mais desencorajadas e confusas, e que a guerra hobbesiana de “todos contra todos” se tornasse uama característica mais proemimente da paisagem social do que já é”.
Mihaly Csikszentmihalyi, Novas Atitudes Mentais, pág.227/228

 Mito e religião
            Alguns especialistas, como Mircea Eliade, estudioso de história comparada das religiões, atribuem importância especial ao contexto religioso do mito. Com efeito, são muito frequentes os mitos que versam sobre a origem dos deuses e do mundo (chamados, respectivamente, mitos teogônicos e cosmogônicos), dos homens, de determinados ritos religiosos, de preceitos morais, tabus, pecados e redenção. Em certas religiões, os mitos formam um corpo doutrinal e estão estreitamente relacionados com os rituais religiosos -- o que levou alguns autores a considerar que a origem e a função dos mitos é explicar os rituais religiosos. Mas tal hipótese não foi universalmente aceita, por não esclarecer a formação dos rituais e porque existem mitos que não correspondem a um ritual. 
            O mito, portanto, é uma linguagem apropriada para a religião. Isso não significa que a religião, tampouco o mito, conte uma história falsa, mas que ambos traduzem numa linguagem plástica (isto é, em descrições e narrações) uma realidade que transcende o senso comum e a racionalidade humana e que, portanto, não cabe em meros conceitos analíticos. Não importa, do ponto de vista do estudo da mitologia e da religião, que Prometeu não tenha sido realmente acorrentado a um rochedo com um abutre a comer-lhe as entranhas, nem que Deus não tenha criado o ser humano a partir do barro. Religião e mito diferem, não quanto à verdade ou falsidade daquilo que narram, mas quanto ao tipo de mensagem que transmitem.
            A mensagem religiosa geralmente exige determinado comportamento perante Deus, o sagrado e os homens, e é, muitas vezes, formulada de forma compatível com conceitos racionais e em doutrinas sistematizadas. O mito abrange maior amplitude de mensagens, desde atitudes antropológicas muito imprecisas, até conteúdos religiosos, pré-científicos, tribais, folclóricos ou simplesmente anedóticos, que são aceitos e formulados de modo menos consciente e deliberado, mais espontâneo, sem considerações críticas.
 
      Mito e sociedade
            Como forma de comunicação humana, o mito está obviamente relacionado com questões de linguagem e também da vida social do homem, uma vez que a narração dos mitos é própria de uma comunidade e de uma tradição comum. Não se conseguiu definir, no entanto, a natureza precisa dessas relações. Alguns lingüistas admitem explicitamente a necessidade de uma ciência mais abrangente, como por exemplo uma nova ciência geral da semiologia, cuja tarefa seria estudar todos os signos essenciais à vida social, e uma nova psicologia, que caracterizaria inicialmente vários sistemas do conhecimento e da crença humanos. O estudo da sociedade e da linguagem pode começar apenas com os elementos fornecidos pela fala e pelas relações sociais humanas, mas em cada caso esse estudo se confronta com uma coerência de tradições que não está directamente aberta à pesquisa. Essa é a área em que atua a mitologia. 
Algumas concepções mitológicas podem exemplificar a complexidade e a variedade das relações entre mito e sociedade. A tribo lugbara (do noroeste de Uganda e do Congo) utiliza um sistema conceptual para relacionar sua ordem sociopolítica a dois heróis ancestrais, relacionados, em contrapartida, à criação do universo. As narrações sobre a evolução da tribo a partir de seus heróis ancestrais são apresentadas na forma de saga, embora a "história" mais primitiva seja contada em mitos. É notável, porém, que o único esquema conceptual do sistema social dos lugbara relacione o passado mítico e o genealógico (não-mítico) e que, em seu conjunto, seja expresso mais em categorias espaciais do que histórico-temporais. 

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